470 mil alunos retornam às aulas no DF com nova regra: celulares proibidos nas escolas
Por Camila Coimbra
redacao@grupojbr.com
Nesta segunda-feira (10), cerca de 470 mil estudantes da rede pública do Distrito Federal retomaram as aulas com uma novidade: a proibição do uso de celulares e aparelhos tecnológicos dentro das escolas, incluindo os intervalos. A medida, baseada na Lei nº 15.100/2025, busca priorizar o foco no aprendizado e a interação social entre os alunos, mas já gera debates sobre sua eficácia e impactos.
Pedro Gabriel, 16 anos, morador da Candangolândia, critica a proibição. “Acho meio sem sentido, porque quem não quer estudar vai sempre encontrar um jeito de burlar isso. Se vão proibir algo, deveriam melhorar outras questões, como o financiamento nas escolas e o investimento em mais livros”, argumenta. O estudante, que cursou o ensino médio em outra escola no ano anterior, relata que a restrição ao celular já existia, mas de forma mais flexível. Para ele, a mudança não será determinante para melhorar a concentração dos alunos. “O pessoal sempre vai dar um jeito de se distrair, seja conversando ou de outras formas”, afirma.
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Como alternativa, Pedro defende que o Ministério da Educação invista na modernização do ensino. “O ideal seria tornar as aulas mais dinâmicas e incentivar o uso de celulares para fins pedagógicos. Isso ajudaria os alunos a pesquisar fontes confiáveis e utilizar a internet de forma produtiva”, sugere.
Já Enzo Medeiros, 17 anos, estudante do terceiro ano do CEF 102 Norte, vê pontos positivos e negativos na medida. “No primeiro dia, ainda é difícil avaliar completamente, mas acredito que pode atrapalhar a comunicação dentro da escola. Se alguém passa mal ou precisa resolver algo urgente, pode ser complicado, já que a secretaria nem sempre está disponível”, pondera. Por outro lado, ele reconhece que o uso inadequado do celular prejudicava o ambiente de aprendizado. “Tinha aluno que não sabia usar de forma consciente e isso gerava conflitos com os professores, às vezes até desrespeito. Então, pode ser que essa mudança tenha um lado positivo”, afirma.
Sandra Leão, 48 anos, mãe de três filhos e professora de teatro, defende a proibição. “Os alunos deixam de se relacionar pessoalmente para manter um relacionamento virtual, até mesmo dentro da escola. A direção não tem como controlar o conteúdo que eles acessam nos intervalos ou durante as aulas. Além disso, o uso excessivo da tecnologia tem sido associado a problemas como déficit de atenção e ansiedade”, afirma.
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Para Sandra, crianças entre 11 e 12 anos não deveriam ter acesso irrestrito a celulares, especialmente dentro do ambiente escolar. “Eles estão em um espaço seguro. Se houver qualquer necessidade, a direção pode entrar em contato com os pais. Não há motivo para que os alunos usem o celular constantemente”, defende. A professora também alerta para os impactos negativos do uso indiscriminado da tecnologia entre os jovens, incluindo casos de cyberbullying. “Eles tiram fotos para zombar dos colegas, fazem exclusão social pela internet. Como esses alunos que são alvos dessas atitudes se sentem? A escola não tem estrutura para controlar tudo isso”, critica.
Marco de Almeida, 40 anos, bancário e pai de três filhos, também apoia a medida. “Eu achei ótimo e super válido. Foi uma decisão um pouco dura, mas necessária. Nós já tínhamos combinados sobre o uso do celular, especialmente na escola, mas eu soube que, mesmo assim, elas usavam no intervalo e em momentos em que alguns professores permitiam. Com essa proibição, o foco volta para a sociabilidade, a educação e a pedagogia”, avalia.
No CEF 102 Norte, a proibição já era uma realidade desde 2022, com celulares guardados em caixas coletivas durante as aulas. A diretora Viviane Lima, 45 anos, relata que a adaptação foi tranquila. “Os alunos já estavam acostumados. No primeiro dia, promovemos debates sobre os malefícios do uso excessivo de telas, como privação de sono e vício em tecnologia”, explica.
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Durante as atividades, os alunos foram divididos em grupos para discutir quatro malefícios do uso excessivo de telas: privação social, privação de sono, vício e atenção fragmentada. “Eles compartilharam experiências pessoais, registraram as conclusões em cartazes e fizeram apresentações para a turma”, acrescenta a diretora. Além disso, os estudantes assistiram a uma reportagem sobre a perda de massa cerebral associada ao uso excessivo de telas e um vídeo de uma escola inglesa que propôs um desafio de 21 dias sem celular.
A iniciativa não se limita aos alunos. A direção da escola também pretende promover uma palestra voltada aos pais para reforçar a conscientização sobre o impacto dos dispositivos eletrônicos no cotidiano dos adolescentes. “Acreditamos que, com esse trabalho, a transição será tranquila para todos”, conclui Viviane.
Especialistas alertam para os riscos do uso excessivo de celulares por crianças e adolescentes. A pediatra Dra. Priscila Xavier explica que a exposição prolongada às telas pode comprometer o desenvolvimento cerebral, aumentar a impulsividade e elevar os riscos de ansiedade e depressão. “A falta de interação presencial prejudica a comunicação e a resolução de conflitos”, ressalta.
A médica também destaca que o uso constante das telas reduz a capacidade de resolução de problemas e prejudica a criatividade. “As respostas prontas oferecidas pelos conteúdos digitais eliminam o espaço para o pensamento crítico e o desenvolvimento de soluções próprias. Além disso, a ausência do tédio, que é essencial para estimular a criatividade, faz com que a mente esteja sempre ocupada sem oportunidades para criar”, conclui.
Entre os transtornos mais comuns associados ao uso excessivo de celulares estão ansiedade, depressão, distúrbios do sono e isolamento social. “A falta de interação presencial pode intensificar o isolamento, tornando essas crianças e adolescentes ainda mais vulneráveis a transtornos mentais”, alerta.
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Outro efeito preocupante é a influência das redes sociais na autoestima dos jovens. A comparação com padrões irreais de vida exibidos nas plataformas digitais pode gerar frustração e sentimentos de insuficiência. “Essa comparação ascendente faz com que eles nunca se sintam bons o suficiente. Além disso, a pressão para estar sempre online e acompanhar tendências contribui para um aumento da ansiedade e do estresse”, destaca Dra. Priscila.
A lei prevê que os celulares devem ficar desligados e guardados nas mochilas ou em locais designados pelas escolas. Em casos de descumprimento, as instituições podem adotar medidas educativas ou disciplinares, priorizando o diálogo com alunos e famílias.
Enquanto alguns veem a proibição como um passo necessário para melhorar o ambiente escolar, outros defendem que o celular pode ser uma ferramenta pedagógica se usado de forma consciente. O desafio, agora, é equilibrar a tecnologia com o desenvolvimento saudável e a qualidade do ensino.