Estilo

Maiores e mais aromáticas, trufas do Brasil conquistam espaço entre chefs



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Em fevereiro, a chef Janaína Torres, fundadora do Bar da Dona Onça, subiu ao palco como convidada do congresso internacional Identità Milano 2025, na Itália. Ali, palestrou sobre a influência italiana na gastronomia paulistana -e contou, entre outras coisas, que o Brasil também produz trufas.

“Os que mais perguntaram foram os cozinheiros brasileiros que vivem na Itália. Ficaram mais surpresos do que os italianos”, afirma a cozinheira.

Embora a produção nacional seja recente -as primeiras trufas brasileiras foram descobertas no Rio Grande do Sul, por acaso, em 2016- e tenha começado de forma tímida, com bolotas diminutas e sem tanto perfume, pode-se dizer que elas cresceram e apareceram. Literalmente.

Essa evolução pode ser vista nos novos pratos do Bar da Dona Onça, com lâminas da trufa Tuber floridanum, apelidada de sapucay, que aparecem sobre canapés de tartare de carne (R$ 120, seis unidades), no topo do capellini na manteiga (R$ 120) e da musse de chocolate (R$ 95).

“Fui para o Sul visitar o pomar onde elas crescem e as trouxe comigo na mão, durante o voo de volta. São muito aromáticas, delicadas, com notas de nozes e amêndoas”, afirma Rueda.

Segundo o biólogo gaúcho Marcelo Sulzbacher, o especialista em fungos que descobriu as trufas brasileiras, a evolução se deve ao aprimoramento das técnicas de manejo. Elas brotam embaixo da terra, coladas às raízes de árvores como nogueiras e castanheiras, e dependem de terreno com água na medida certa.

“Precisam de umidade, mas têm que respirar no solo, que não deve estar encharcado. A cobertura vegetal também ajuda a proporcionar conforto térmico”, explica.

Paulistano radicado em Porto Alegre, onde comanda a cozinha da Benjamin Osteria, o chef Bruno Hoffmann adquiriu 1,6 quilo de trufas sapucay na temporada atual, que começou em novembro e chega ao fim agora em março. Serviu as lâminas sobre tagliolini na manteiga de cogumelos e no topo de um raviolo de creme de palmito, mas o estoque já se esgotou.

Para ele, a espécie nacional vem melhorando a cada ano, mas não deve ser comparada às europeias. “As primeiras eram bolinhas de pouco mais de 3 centímetros, mas neste ano recebi uma com 45 gramas. Mesmo maiores, são naturalmente mais suaves.”

Hoffmann fala com conhecimento de causa. Ele iniciou a carreira no extinto Al Castello di Alessandro Boglione, duas estrelas Michelin que ficava em Alba, norte da Itália, região onde ocorrem as trufas brancas mais caras do mundo -chegaram a custar 4.500 euros o quilo na temporada 2024, o equivalente a R$ 27 mil. Em restaurantes paulistanos, o grama foi cotado a mais de R$ 80.

O preço da sapucay não chega a tanto. Nas duas unidades da Tartuferia San Paolo, onde a trufa brasileira pode ser laminada sobre qualquer prato, o cliente desembolsa R$ 20 por cada grama. Três gramas é a quantidade mínima recomendada, ou seja, R$ 60 são somados ao valor do prato. “A sapucay está chegando pelo preço das trufas negras italianas”, compara Monica Claro, sócia dos restaurantes.

No Rio de Janeiro, o chef Rafa Gomes, do Tiara, serve sapucay sobre nhoque de batata-baroa. A R$ 198, o prato já vem com três gramas de sapucay laminada, mas a casa permite que o cliente ponha trufas sobre qualquer outra receita -neste caso, três gramas saem por R$ 94, fora o preço do prato.

Chef do Capincho, em Porto Alegre (RS), Marcelo Schambeck adquiriu trufas nacionais pela terceira vez, nesta temporada, e registra uma curiosidade crescente pelo ingrediente. Atualmente, as lâminas aparecem sobre o entrecôte ao molho de cogumelos (R$ 340).

“Fiz um evento fechado para um grupo e o cliente me contou que compraria trufas europeias. Sugeri que usasse as nacionais e todos se surpreenderam com o tamanho e a qualidade”, afirma o chef.

Por enquanto, o principal fornecedor de trufas sapucay é a Paralelo 30, propriedade com 122 hectares de pomar, em Cachoeira do Sul (RS), cujo negócio principal é a produção de noz-pecã. Na temporada 2024/2025, foram colhidos 50 quilos. Lá, as trufas foram descobertas por acaso, mas já tem gente investindo no plantio de mudas já inoculadas.

A Simbiose Tartufo, fundada por Marcelo Sulzbacher, vende mudas inoculadas com os esporos das trufas e já implementou 15 hectares, em terrenos do Sul e do Sudeste. Regiões frias e montanhosas, como a Serra da Mantiqueira, são as mais indicadas.

Segundo o biólogo, a sapucay não é a única promessa para o Brasil. Trufas da espécie Tuber borchii, conhecidas na Itália como bianchetto, já foram encontradas em São Bento do Sapucaí (SP), e da espécie Tuber lyonii, a rubi, conhecida nos Estados Unidos, foram descobertas em Santa Cruz do Sul (RS).

Há cerca de dois meses, Sulzbacher descobriu mais uma variedade. “Colhia trufas na Paralelo 30 quando, no meio das sapucay, vi uma diferente, com aroma forte. Ainda não concluímos os estudos. Mas, para quem dizia que o Brasil jamais teria trufas…”


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *