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A polêmica tentativa de reencenar batalhas de glad…

Em maio de 2025, o Coliseu, em Roma, será palco de uma nova rodada de batalhas. Dessa vez, a arena não será tomada por guerreiros e escravos, como aqueles que lutavam pela vida no auge do Império Romano. Nem por atores, como Russell Crowe e Paul Mescal, que estrelaram os épicos Gladiador, de 2000, e Gladiador II, recém-lançado, ambos dirigidos por Ridley Scott. Serão turistas, escolhidos a partir de uma iniciativa da plataforma de aluguel de imóveis por temporada Airbnb, convidados a participar de uma simulação das lutas de gladiadores. “Você sentirá a adrenalina pulsar nas veias, a areia deslizar entre os dedos e o peso imponente da armadura sobre os ombros. Ouvirá o eco dos antigos gladiadores ressoar nas catacumbas do Coliseu e o tilintar inconfundível do aço em pleno combate”, diz o material promocional do evento. Para os fãs dos filmes, a proposta é empolgante. Há, contudo, um movimento que se opõe à ideia com carradas de razão.

INSPIRAÇÃO - Cena do filme Gladiador II: eterno fascínio pela antiguidade (Paramount Pictures/.)

Os moradores da capital italiana, em particular, e os amantes de patrimônios da arquitetura chiam barbaridade. Para eles, a iniciativa de marketing poderia danificar as ruínas do anfiteatro e prejudicar o acesso democrático de todos os visitantes ao local. A ideia faz parte de um projeto do Airbnb batizado de “Icônicos”. Lançado em maio deste ano, propõe oferecer as “experiências mais extraordinárias da Terra”. A lista de ofertas anteriores inclui noites dentro do Museu de Orsay, em Paris, no museu da Ferrari, em Maranello, na Itália, e na casa do roqueiro Prince (1958-2016) no filme Purple Rain, de 1984. Para participar, os usuários da plataforma precisam se inscrever e justificar os motivos pelos quais merecem ser escolhidos. O sorteio de potenciais visitantes é feito aleatoriamente, mas as respostas são analisadas para garantir que os eleitos tenham alguma ligação com o evento em questão.

No caso do Coliseu, a proposta caiu muito, mas muito mal. “Não podemos transformar um dos monumentos mais relevantes do mundo em um parque temático”, diz Massimiliano Smeriglio, conselheiro de Cultura da cidade de Roma. “Essa iniciativa incentiva a mercantilização e o consumo da cultura. É um princípio que vai na direção oposta daquele que perseguimos, o de um patrimônio frutífero e acessível a todos, turistas, romanos e romanas”, acrescentou, em comunicado oficial. O Airbnb tenta se defender dizendo que o empreendimento faz parte do compromisso de revitalizar o turismo em destinos históricos na Europa. Segundo a empresa, mais de 10 milhões de dólares foram investidos em projetos de conservação em todo o continente. No caso do Coliseu, o acordo prevê 1,5 milhão de dólares usados para restaurar uma exposição permanente dentro da construção. Não foi suficiente. Nas redes sociais, não sobrou pedra sobre pedra, e a acusação mais gentil foi dizer que ninguém gostaria de ver o espaço transformado numa “Disneylândia”.

VETO - Pirâmide de Teotihuacan, no México: não dá mais para subir os degraus
VETO - Pirâmide de Teotihuacan, no México: não dá mais para subir os degraus (Pavel Tochinsky/The Image Bank/Getty Images)
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Não é a primeira vez que o Airbnb é alvo da revolta dos italianos. No ano passado, a companhia aceitou fechar um acordo avaliado em 621 milhões de dólares para quitar impostos atrasados. Mas não é só isso. Há um movimento mais amplo contra o excesso de viajantes que têm invadido destinos badalados da Europa. Habitantes de Barcelona e Amsterdã foram às ruas pedir para que sejam criadas limitações legais para a chegada de estrangeiros. Os argumentos: faltam moradias em regiões centrais, com apartamentos oferecidos para curtas temporadas, e a rotina vira caos. As autoridades, premidas, começam a impor severas restrições.

LIMITES - As ruínas de Pompeia, na Itália: apenas 20 000 pessoas por dia
LIMITES - As ruínas de Pompeia, na Itália: apenas 20 000 pessoas por dia (Jacques LOÏC/Photononstop/Getty Images)

As ruínas de Pompeia, perto de Nápoles, passaram a receber no máximo 20 000 turistas por dia como forma de preservar o local. Outro exemplo vem do México, que proibiu o acesso, por escadas, ao topo das pirâmides de Teotihuacan. Visitar os monumentos é uma experiência incrível, sem dúvida, mas é fundamental garantir a preservação, mesmo que represente algum tipo de bloqueio e muito muxoxo. É movimento bem-vindo para que novas gerações possam aproveitar o que as antigas deixaram de legado. Assim caminha a humanidade.

Publicado em VEJA de 13 de dezembro de 2024, edição nº 2923

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