Política

Bolsonarismo dribla derrotas, vê ponto de virada com crise do Pix e acende alerta na base de Lula


JOELMIR TAVARES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Aliados de Jair Bolsonaro (PL) computaram uma vitória com a crise do Pix e usaram o recuo do governo Lula (PT) para tentar se fortalecer após reveses, como o indiciamento do ex-presidente no caso da trama golpista e o risco de ele virar réu. No campo governista, o alerta provocado pela mobilização contrária nas redes expôs desafios para o plano de conquistar novo mandato em 2026.

A principal fragilidade admitida por integrantes do governo é na comunicação, com a já conhecida dificuldade da esquerda de fazer frente aos conservadores na esfera digital.

O vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que viralizou com especulações sobre taxação das transações bancárias, apontou para a urgência de reação na área, agora entregue por Lula ao marqueteiro Sidônio Palmeira, que assumiu a Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência).

“O episódio do Pix simboliza uma virada na batalha política do Brasil e revelou uma verdade inquietante que a própria esquerda admitiu publicamente: o governo Lula está capenga”, diz a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que vê se criar um clima para manifestações por impeachment.

O episódio do Pix ocorreu após uma série de dissabores para o bolsonarismo, que incluem o cerco jurídico aos 40 indiciados pela Polícia Federal. Um deles, o general Walter Braga Netto, vice na chapa de Bolsonaro em 2022, foi preso no mês passado, numa inédita decisão contra um militar do mais alto posto do Exército.

Àquela altura, o grupo já amargava o derretimento da pauta de anistia para envolvidos no 8 de janeiro. A bandeira perdeu fôlego em novembro, após o ataque em que um ex-candidato a vereador pelo PL se explodiu na frente do STF (Supremo Tribunal Federal), reacendendo as pressões por punição para atos antidemocráticos.

Por outro lado, a direita no Brasil vê chances de ser beneficiada por novos ventos no plano internacional, com a posse, nesta segunda-feira (20), de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos, e o anúncio da Meta sobre o fim de seu programa de checagem e a derrubada de filtros no Facebook e Instagram.

“Agora vamos ter um pouco mais de liberdade para fazer a discussão política nas redes”, diz o deputado estadual Gil Diniz (PL-SP). “A questão do Pix só canalizou a raiva generalizada que a população está sentindo. Chegou até as pessoas despolitizadas e uniu gregos e troianos contra o Lula.”

Para ele, que é próximo da família Bolsonaro, decisões do ministro do STF Alexandre de Moraes como negar o pedido do ex-presidente para ir à posse de Trump reforçam a impressão de perseguição e acabam aglutinando a base.

“O Bolsonaro não perdeu capital político. Tem coisas que adormecem um pouco o sentimento [dos bolsonaristas], mas continuamos com o [ex-]presidente. Temos possibilidade de voltar ao poder, sim. Na ausência dele, a minha aposta é no Eduardo [Bolsonaro, deputado]”, afirma.

Para Zambelli -que, assim como Diniz, viajou para a posse nos EUA-, a direita exibe resiliência em momentos de adversidade. “Mesmo silenciosamente, não recuamos”, diz ela, lembrando que Bolsonaro pontua em pesquisas para 2026 -ele trabalha pela reversão da inelegibilidade, apesar da chance remota.

O senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo Lula no Congresso, contemporiza a crise do Pix lançando mão de metáforas do futebol. “A gente está disputando um campeonato de pontos corridos. O time pode até perder um jogo, mas não pode é perder o campeonato”, diz.

No racha da esquerda em torno da revogação da norma da Receita Federal para fiscalizar as transações, anunciada na quarta-feira (15), Randolfe ficou do lado dos que consideraram a medida acertada, já que, “em uma partida inglória, é melhor encerrá-la logo e partir para outra”.

Outras correntes avaliam que o governo demonstrou falta de pulso, foi lento e abriu um flanco ao ceder à pressão bolsonarista nas redes, algo preocupante do ponto de vista eleitoral. O deputado federal Zeca

Dirceu (PT-PR) chegou a dizer que a “situação é péssima” e estava com “paciência zero” com o governo.

Randolfe diz que o episódio está superado e que o governo “tem muito mais a mostrar” do que a oposição quando ocupou o Planalto. “As informações do que estamos fazendo pelo povo têm que chegar às pessoas”, afirma, pregando o combate às fake news como única saída.

Para Erika Hilton (PSOL-SP), líder da bancada da federação PSOL-Rede na Câmara, a prioridade é regular as redes -tema que a direita explora no sentido de acusar censura. A deputada chama de criminosa a circulação de um vídeo falso feito por inteligência artificial no qual um clone virtual do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, falava da criação de supostos impostos sobre Pix e animais de estimação.

“A lição que fica é que o governo precisa de uma comunicação mais ágil, com previsibilidade e plano de contenção. É preciso falar a língua das pessoas e de maneira clara, para que elas não se percam em narrativas falaciosas”, diz Erika, para quem o Planalto “deu uma carta na mão da extrema direita” ao não se antecipar para explicar a norma da Receita. “Foi um estrago grandioso.”


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