Câncer de mama: pessoas trans também devem se prevenir; veja como
O câncer de mama atinge cerca de 73.610 pessoas por ano, de acordo com estimativa feita pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca). Apesar de a incidência da doença ser maior em mulheres cisgênero, a população transgênero também deve estar alerta para os riscos, realizar os exames periódicos e tomar medidas preventivas contra o tumor.
Segundo uma pesquisa realizada pela Universidade de Amsterdã, as mulheres trans apresentam um risco 46 vezes maior para o câncer de mama em comparação aos homens cis. “Esse aumento decorre, provavelmente, do uso de estrogênio associado a medicações antiandrogênicas essenciais para a transição de gênero”, explica Sérgio Okano, sexologista, ginecologista e obstetra, à CNN.
No entanto, é importante lembrar que essa incidência equivale a aproximadamente 0,5% das mulheres cis. “Ou seja, embora o uso de hormônios aumente o risco, ele ainda é muito menor do que observamos nas mulheres cis”, ressalta o especialista.
Além das mulheres trans, homens trans que não realizaram cirurgia de retirada das mamas também estão em risco para o câncer e devem ser submetidos ao rastreio da doença. Por outro lado, de acordo com Abna Vieira, oncologista da Oncoclínicas, o risco nessa população pode ser um pouco menor em relação às mulheres cis devido à terapia androgênica e à terapia de supressão ovariana.
Dificuldade de acesso ao diagnóstico precoce ainda é desafio para tratamento
Segundo dados do Inca, o câncer de mama causou mais de 18 mil mortes em 2021. O diagnóstico precoce do tumor é essencial para aumentar a chance de tratamentos menos agressivos e com maior taxa de sucesso e cura.
No entanto, no caso da população trans, existe uma maior dificuldade no acesso às medidas de prevenção e diagnósticos precoces. “A discriminação e o preconceito fazem com que muitos pacientes evitem buscar suporte médico. Mulheres trans devem fazer acompanhamento da próstata e da mama, e homens trans devem realizar os exames de papanicolau e mamografia”, explica Viera.
“Sabemos que, quando falamos em câncer, o diagnóstico precoce e as medidas de prevenção são fundamentais para a perspectiva de cura e um tratamento menos invasivo. As barreiras sociais podem afetar exatamente esse aspecto: sem acompanhamento médico, o câncer pode ser uma doença que afeta de forma mais letal”, completa.
Além disso, preconceitos e estigmatização da população trans também são obstáculos para o maior acesso aos serviços de prevenção e detecção precoce do câncer de mama.
“Ginecologistas e mastologistas podem se negar a atender essas mulheres, o que reduz o rastreio não só do câncer de mama nessa população, mas de inúmeros outros agravos”, afirma Okano. “Além do uso de hormônios, existe uma alta taxa de tabagismo, obesidade e uso abusivo do álcool entre esses grupos, o que também são considerados fatores de riscos que podem ocasionar o câncer de mama”, acrescenta.
Rastreio e prevenção do câncer de mama em pessoas trans
Os homens trans que não realizaram mamoplastia masculinizadora — cirurgia plástica que remove as glândulas mamárias e a aréola — devem realizar o rastreio do câncer de mama seguindo as mesmas recomendações para as mulheres cis.
Atualmente, o Ministério da Saúde recomenda que a mamografia seja feita a cada dois anos, a partir dos 50 anos, para o público geral, e a partir dos 40 anos para quem tem histórico familiar do câncer. Já as sociedades médicas — como a Sociedade Brasileira de Mastologia, o Colégio Brasileiro de Radiologia e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) — recomendam a mamografia anual a partir dos 40 anos, seguindo o protocolo da American Cancer Society.
Já homens trans que realizaram a mamoplastia masculinizadora parecem possuir uma redução significativa no risco de câncer de mama, mas ainda há poucos estudos sobre o assunto, de acordo com Okano.
“Os guidelines internacionais inclusive questionam se o homem trans que realizou a mamoplastia deve ser submetido a esse rastreio, uma vez que a retirada da glândula mamária reduz significativamente a incidência de câncer de mama, em paciente cis com alto risco da doença”, comenta o especialista.
Mulheres trans que realizam terapia hormonal para aquisição de características femininas há, pelo menos, cinco anos também devem ser submetidas aos mesmos rastreios que mulheres cis, com a realização anual de exames de mama.
“Elas devem manter o rastreamento da população geral. Mas, o mais importante é estarem cientes de tais riscos, terem informações sobre medidas preventivas e terem um profissional de saúde que vai individualizar os exames e investigação para cada paciente”, ressalta Vieira.
Segundo os especialistas consultados, uma forma de mitigar os riscos associados à harmonização em mulheres trans é utilizar hormônios adequados e com supervisão médica.
“Infelizmente, inclusive por dificuldade de acesso, a maioria das mulheres trans chega aos serviços especializados já em uso de alguma terapêutica realizada por protocolos da internet ou informação de amigas. É muito comum o uso de contraceptivos e hormônios em altas doses por esse grupo, quase 90% já fizeram uso dessas medicações antes da avaliação especializada”, avalia Okano.
Somado a isso, é importante tomar medidas gerais de prevenção do câncer de mama, como evitar o tabagismo, o consumo de álcool, combater o sedentarismo e obesidade, além de manter uma alimentação saudável.
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