Estilo

Criadora do Met Gala, editora da Vogue e inspiração para ‘O Diabo Veste Prada’, Anna Wintour faz 75 anos


TETÉ RIBEIRO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)

Hoje, dia 3 de novembro de 2024, talvez seja uma data que Anna Wintour prefira ignorar. São 75 anos, afinal de contas, número bastante alto mesmo para seres humanos normais, quando não dá mais para negar que a vida está rumando para aquele final bem sem charme, e que nos iguala a todos os seres vivos. Sem charme e igual a todo mundo talvez sejam as duas características mais detestadas por essa mulher.

Brilhante e enigmática, Wintour viveu todas as suas sete décadas e meia de vida fazendo tudo que estava ao seu alcance para se diferenciar dos seres humanos normais, o que quer que seja isso. Como será que a mulher impecável que inspirou a personagem Miranda Priestly, interpretada por Meryl Streep em “O Diabo Veste Prada”, vai enfrentar essa efeméride?

Pode ser com uma grande festa temática, repleta de celebridades que passaram meses pensando no que vestir para decifrar o dress code criado por ela, como acontece todo ano no Met Gala, evento que ela criou como uma forma de arrecadar fundos para o Instituto de Moda (Costume Institute) do Metropolitan Museum of Art de Nova York. Met, para os íntimos.

O evento, no qual o mundo pop para tudo para assistir à chegada dos convidados -e só isso, já que fotógrafos e mesmo os participantes são proibidos de registrar o que acontece dentro da festa, portanto o que vemos todo ano são apenas as pessoas saindo das limusines e subindo as icônicas escadas do museu-, marca a abertura da exposição anual do Instituto.

O Met Gala é um dos eventos de moda mais importantes do mundo, e sua data já está no calendário oficial tanto da cidade de Nova York quanto da vida dos ultra famosos. Acontece, tradicionalmente, na primeira segunda-feira de maio, e reúne celebridades, estilistas, artistas, influenciadores e figuras públicas, que criam trajes inspirados no tema da exposição daquele ano.

Mas não basta comprar uma roupa boa ou pagar uma fortuna em uma bolsa feita com pele de crocodilos recém-nascidos para se sair bem com Anna Wintour no Met Gala. Os convidados devem criar seus looks interpretando artisticamente, de maneira ousada e elegante, o tema de cada edição. A editoratrix trabalha duro para fazer a lista de convidados ideal e cuida de cada detalhe tanto da exposição quanto da festa.

A próxima edição acontecerá no dia 5 de maio de 2025, e o tema será “Superfine: Tailoring Black Style” (“Impecável: A Confecção do Estilo Negro”), uma brincadeira com o termo “superfine”, expressão culturalmente usada como elogio entre os homens negros e que se refere, especificamente, a um estilo de alfaiataria que usa tecidos e acabamentos de alta qualidade para produzir roupas finas e culturalmente significativas.

Pense, por exemplo, no personagem Shell Gordon, interpretado por Wood Harris na série “A Mulher no Lago”. Ou em Django, personagem de Jamie Foxx no filme “Django Livre”, dirigido por Quentin Tarantino. Ou, numa versão mais moderna, T’Challa, personagem do ator Chadwick Boseman em “Pantera Negra”.

A exposição, assim como os convidados do baile de gala, vão exibir suas versões do impacto da cultura e estética negras na moda de alfaiataria masculina, tendo como ponto de partida o “dandismo negro”, um estilo e uma cultura que enfatizam a apresentação da identidade negra, muitas vezes incorporando elementos de moda e comportamento sofisticados que desafiam estereótipos.

O evento é um marco cultural, assim como o visual aparentemente intocável de sua criadora, conhecida pela elegância e excentricidade, elogiada por sua eficiência e poder de realização, e temida por sua dureza nos julgamentos e comportamento inesperado.

Uma coincidência especialmente simbólica: a data do Met Gala do ano que vem é a mesma do início do julgamento do rapper Diddy, que foi, durante muitos anos, eleito o homem negro mais elegante dos EUA.

No próximo dia 5/5, infelizmente, vai trocar o traje ousado e as joias, onipresentes em seu visual desde sempre, pelo macacão laranja dos presidiários americanos.

Mas Anna Wintour não é nunca previsível, e pode ser que opte por um jantar em Londres, Nova York ou algumas das cidades mais ricas do planeta, que ela costuma frequentar, com seu “melhor amigo”, o ator inglês Bill Nighy. Aos 74 anos, o ator discreto e muito magro, de carreira notável (e que estourou como o ex-roqueiro sem papas na língua de “Simplesmente Amor”), tem sido a companhia mais constante de Anna Wintour nos últimos anos.

Eles não confirmam nem desmentem os boatos de que seriam, na verdade, amantes. Nenhum dos dois tem nenhum impedimento para se envolver em um novo romance. Wintour foi casada por 15 anos com o psicanalista inglês David Shaffer, com quem tem seus dois filhos, Charlie, de 39 anos, e Katherine, de 37. O casal se separou no ano 2000.

Depois, Wintour se casou em 2004 com o empresário norte-americano Shelby Bryan, com quem não teve filhos, e de quem se separou em 2020. Já o ator inglês, seu companheiro frequente desde 2022, Bill Nighy foi casado com a figurinista inglesa Diana Quick durante quase 30 anos, mas se separou em 2008. Tem uma filha adulta, Mary Nighy.

Talvez ela tenha sentido os efeitos maléficos do chamado “inferno astral”, o período que dura um mês e antecede o aniversário de uma pessoa, quando ela é supostamente mais suscetível a desafios e dificuldades. Esse conceito vem da astrologia, que afirma que as influências dos planetas e do próprio signo se tornam mais intensas durante este tempo, e quem o enfrenta pode sentir uma energia negativa ou turbulenta. É visto como um momento de preparação para o novo ciclo que começa no aniversário.

E Deus e todos os astros nos protejam de Anna Wintour no inferno astral. Não que ela jamais vá se preocupar com o que um jornal brasileiro vai escrever sobre ela. Mas, com relação à lendária editora da Vogue americana, os fatos, rumores e anedotas parecem mais estranhos que qualquer ficção.

Suas assistentes, como a escritora Lauren Weisberger, que trabalhou diretamente com Wintour por um ano, e se baseou na ex-chefe para escrever o romance “O Diabo veste Prada”, lançado em 2003, e transformado em longa-metragem em 2006, toda manhã precisam, sem exceção, comprar um café com leite e um muffin de mirtilo fresco na mesa de trabalho da editora, que quase sempre toma o café e joga o muffin no lixo.

Famosa também é a história do dia em que ela pediu ao setor de arte da revista que usasse o Photoshop para cortar as gordurinhas extras no pescoço de um bebê que sairia na revista.

O estilista americano Marc Jacobs, um dos que creditam Anna como uma de suas “madrinhas profissionais”, contou em uma entrevista que, quando se viciou em drogas e lutava para sair do ciclo de dependência, foi convidado para um almoço com Wintour, em que ela perguntou a ele “por que você não aprende a jogar tênis? É uma ótima alternativa às drogas”. O estilista ri da história e da aparente falta de noção, apesar da boa intenção, da colega.

Sempre de roupas de grife e salto alto, Anna Wintour surpreendeu seus colegas de trabalho quando vestiu uma sandália rasteira no dia 12/9/2001. Foi o dia seguinte ao ataque terrorista que derrubou as torres gêmeas de Nova York, e a editora não deixou que o fato abalasse sua agenda, mas vestiu o que considerou mais apropriado para o caso de precisar sair às pressas da Redação.

Mais chocante ainda para sua equipe foi quando, no ano 2000, Anna Wintour voltou ao trabalho no dia seguinte ao de um mini lifting, uma cirurgia plástica, no rosto, com hematomas ainda visíveis. Ou a vez em que chorou no meio de um discurso para a Redação, quando seu ex-amigo transformado em rival, Donald Trump, venceu as eleições para Mas sua vida e sua obra não devem ser transformadas só em uma série de anedotas. Anna Wintour é uma das mulheres mais relevantes do jornalismo e da moda da segunda metade do século passado e desses primeiros 24 anos do século 21.

Sob sua liderança, a Vogue deixou de ser um catálogo de roupas inacessíveis e se transformou em um espaço em que as tendências de moda se encontravam com a cultura pop, o cinema, a política e até mesmo o ativismo social. No primeiro editorial de moda que fez quando assumiu a revista, vestiu uma modelo em um jeans simples com uma jaqueta de grife. Hoje em dia isso pode parecer banal, mas, em 1988, foi um gesto anárquico e muito simbólico.

Aquela revista, chefiada por aquela figura gélida e impenetrável, iria refletir as mudanças da sociedade, e muitas vezes, apontar o caminho do futuro. Que continue assim, tanto a Vogue quanto o Met Gala e a aniversariante do dia.


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