PT pediu vaga no TCU para apoiar Hugo Motta e vai indicar próximo ministro, diz Lira
CAMILA MATTOSO E VICTORIA AZEVEDO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), diz à Folha que foi fechado um acordo para que o PT indique um representante a uma vaga no TCU (Tribunal de Contas da União).
Isso ocorreu no bojo das negociações para que o partido apoiasse a candidatura de Hugo Motta (Republicanos-PB) à presidência da Câmara.
“O PT solicitou a indicação da bancada deles. Eles reclamam que politicamente nunca tiveram um representante no TCU. [Há o compromisso] com o PT, sim, de eles indicarem a vaga”, afirma.
Com a aposentadoria de dois ministros do tribunal, duas vagas serão abertas até 2027, e a indicação de novos nomes pela Câmara entrou nas negociações.
Lira falou à reportagem na noite de quarta-feira (30), horas após o PT de Lula e o PL de Jair Bolsonaro anunciarem apoio ao nome de seu candidato na disputa.
Como o sr. avalia a sua condução no processo para escolher um candidato para sua sucessão?
Procurei trabalhar o tempo todo para construir uma candidatura que unificasse, que pudesse convergir. Fui com muito cuidado e sensibilidade, porque a princípio tinham três candidatos, que votaram comigo duas vezes com retidão, com anos de parceria.
Nunca falei com ninguém a respeito de quem era o nome, porque estava em construção. O líder Elmar [Nascimento] é amigo? É. Se pudesse votar sozinho, talvez fosse ele. Mas isso faz parte de uma construção partidária, de uma Casa plural.
Num momento, ficou claro que a Casa queria uma oportunidade de ter um candidato mais do meio. Durmo com tranquilidade de que tudo que está acontecendo é fruto de muita confiança entre partidos e deputados, que vão amadurecendo para saber diferenciar a luta administrativa dentro da Casa das lutas ideológica por pautas e por bandeiras no plenário.
É possível atrair o PSD e o União Brasil?
Fiz questão de me referir ao [Antonio] Brito e ao Elmar, além de parceiros, como amigos de vida. Há essa preocupação de estar todo mundo atendido. Vou trabalhar muito para terminar essa jornada com todos os partidos organizados e continuar conversando. Tem tempo e tem espaço.
Elmar está muito chateado, falando em traição e deslealdade. Como vê isso?
Tudo tem que ter um tempo a maturar. Vou trabalhar 24 horas para que isso seja superado. Mantenho o meu sentimento por ele de muita amizade.
A política fala em “Elmar, homem-bomba”. Existe alguma bomba?
Absolutamente nenhuma.
O que entrou no acordo para o PT apoiar Hugo Motta?
A minha relação com o presidente Lula e com o PT não é antiga. Mas a minha relação dentro da Casa com os deputados dos partidos é antiga. Conheci pessoalmente o presidente após a eleição dele, aqui nesta Casa. Toda a nossa conversa a partir daí se confirmou através de ações corretas e apoio ao governo naquilo que assumimos.
Em todas as oportunidades que o presidente Lula pôde falar, disse que eu teria a preferência de conduzir a minha sucessão. Sempre tivemos conversa boa. Da mesma forma como eu mantenho com o ex-presidente [Jair] Bolsonaro. O PL e o PT estão no bloco majoritário e vão ficar juntos no mesmo bloco agora da segunda mesa.
A gente sabe que sempre tem negociações de interesses dos partidos…
As negociações são administrativas. Espaços na mesa, nas comissões, as relatorias. E muitos partidos trazem pautas.
A vaga do TCU entrou no acordo com o PT?
Acho que é lícito, mas [ainda] não tem a vaga. Se houver, o PT solicitou, sim, a indicação da bancada deles. Eles reclamam politicamente que nunca tiveram um representante no TCU e, quando tiveram candidatos, não tiveram êxito no plenário, que é a segunda etapa.
Mas houve um compromisso?
Com o PT, sim. De eles indicarem a vaga no TCU.
Como se deu a costura para o sr. anunciar a criação da comissão especial para analisar o PL da Anistia?
O projeto estava sendo inapropriadamente usado para eleição na Mesa. A vontade do que vai ou não votar é da Casa, não do presidente. Um tema sensível como esse, por tudo que aconteceu, por tudo que está acontecendo, estava sendo usado inapropriadamente. Conversei tanto com um partido quanto com outro. Nós vamos dar a solução para isso dentro do meu mandato, conversando e ouvindo muito, como sempre faço.
O que falta para resolver o imbróglio das emendas parlamentares?
O acordo existe entre Câmara, Senado e governo. Há um sentimento de preocupação com universidades e hospitais precisando de recursos, com obras paralisadas.
Fala-se até hoje de ‘orçamento secreto’. Para mim, é muito pior o ano de 2023 do que o de 2022, o de 2021. Nem vocês sabem como foi feita a programação dos ministérios, com relação à origem de indicação, de quem é e como é. Nesse momento, Executivo, Senado e Câmara estão alinhados no texto que estão propondo.
Há um prazo para essa definição?
Esperava ter votado nesta semana. Todos os partidos estão reclamando da paralisação.
Líderes dizem que o sr. é um crítico da interferência de Poderes. Esse caso é um exemplo?
A sobreposição de um Poder sobre o outro, seja ele qual for, é muito ruim. E a Câmara nunca se sobrepôs nem ao Executivo, nem ao Senado, nem ao Supremo. Sempre prezei por muito equilíbrio. E quem preza por equilíbrio não gosta quando o jogo desequilibra. Não estou dizendo que A, B ou C estão desequilibrando.
A PEC das decisões monocráticas vai andar na Câmara?
Não tive nenhuma reunião de líderes ainda para discutir isso. Mas há um sentimento muito grande no Congresso, da esquerda, do centro e da direita, de que atos monocráticos contra deliberações do Congresso possam ser modulados.
O sr. acha que o resultado das eleições municipais, com crescimento do centro e da direita, deve impulsionar uma reforma ministerial no governo?
Na minha visão, eleição municipal é uma coisa, eleição nacional é outra.
Mas algum recado se tira desse resultado.
Sim, que o Brasil é um país mais conservador, de centro-direita. O que é o retrato do país? Um país de centro-direita no Parlamento e um governo progressista, no Executivo, o que obriga convergência de trabalho, de discussão, de construção.
O sr. acha que deve ter mais espaço para partidos de centro numa eventual reforma?
Não é mais espaço. O PP não está pleiteando nada. Acho até que, para o que o PP contribuiu com a presidência da Câmara, eu sou do partido, com as votações que apoiou e votos que deu, nós temos muito menos participação do que outros partidos. Quem tem que fazer essa avaliação, se está bom, se está ruim, se precisa melhorar, que rumos dar, é o governo. O governo é do presidente Lula.
Em várias oportunidades o sr. foi colocado como alguém truculento. Como avalia essa crítica? E o sr. faz alguma autocrítica?
A política criou um estereótipo de que político bom é aquele que dá tapinha nas costas, ri e só diz o que as pessoas querem ouvir. Eu faço política há 34 anos, nunca mudei a minha maneira de ser com relação às pessoas. Sou duro, carinhoso ou amigo quando tem que ser. Não minto, não blefo, faço a política reta, e as pessoas talvez gostem. Não conheço um truculento que teve 464 votos numa reeleição. Estereótipos são criados, mas não me acho assim tão truculento, não.
Raio-X Arthur Lira, 55
Deputado federal por Alagoas, está no quarto mandato. Foi eleito presidente da Câmara em fevereiro de 2021 e reeleito em 2023. Antes, foi vereador em Maceió por duas legislaturas e deputado estadual por três. Filiado ao PP desde 2009, passou antes por PFL, PSDB, PTB e PMN.