Saúde dos médicos: jornadas exaustivas prejudicam sua saúde e atendimento
Quando penso na dedicação dos médicos, com os quais convivo, vejo pessoas apaixonadas pela vida e pela saúde, mas também me pergunto: e quem cuida de quem cuida? É inegável que as jornadas exaustivas fazem parte da rotina de muitos deles. Horas sem dormir, plantões consecutivos, encaixes na agenda de pacientes com emergências e, quando o expediente acaba, ainda existem os recados que foram deixados durante o dia e precisam de uma devolutiva. Sem esquecer de mencionar os horários extras para estudos e participação em congressos a fim de atualização. Por isso é preciso refletir sobre o impacto na saúde física e emocional desses profissionais.
Costumo dizer para os meus pacientes que é como a máscara de oxigênio no avião: precisamos colocá-la primeiro em nós mesmos antes de ajudar crianças ou idosos. Essa analogia nunca foi tão importante quanto no contexto da saúde dos médicos. Como alguém pode cuidar com excelência se está à beira do esgotamento? Dados recentes mostram que entre 30% e 50% dos médicos apresentam sintomas de burnout, marcados por exaustão emocional, despersonalização e uma sensação de baixa realização profissional.
Essas condições podem não afetar apenas o médico, mas também o paciente. Por exemplo, um médico com distúrbios de sono pode ter prejudicada a sua capacidade de tomar decisões rápidas e assertivas, o que aumenta o risco de erros médicos, comprometendo toda uma carreira. A saúde física também paga um preço alto. Estudos mostram que jornadas extensas estão associadas a hipertensão, distúrbios cardiovasculares e problemas relacionados ao sono.
Não tem muito tempo que presenciamos, durante a pandemia de covid-19, médicos trabalhando no limite, na verdade além dele, e com consequências devastadoras para muitos.
Por outro lado, há esperança. Diferentemente das gerações anteriores, que muitas vezes associavam longas jornadas e sacrifícios pessoais como um preço inevitável da dedicação à profissão, os médicos mais jovens têm buscado integrar práticas que favoreçam a saúde mental e a qualidade de vida.
Esse movimento não significa falta de compromisso com a medicina, mas sim uma compreensão mais ampla de que, para oferecer cuidado de qualidade, é preciso estar em equilíbrio. A exaustão crônica e o burnout, frequentemente resultantes de jornadas extensas, têm consequências diretas no desempenho clínico e na capacidade de empatia com os pacientes. Assim, os médicos mais jovens argumentam que proteger sua saúde mental e física é uma extensão do compromisso com seus pacientes e a profissão como um todo.
Além disso, muitos desses profissionais priorizam a flexibilidade de horários e buscam carreiras que permitam dedicar tempo à família, ao lazer e ao autocuidado. Eles também têm pressionado por mudanças no sistema de saúde, como a redução de plantões e a implementação de políticas de bem-estar no ambiente de trabalho. Durante a pandemia de covid-19, ficou ainda mais evidente a importância dessas práticas, já que o esgotamento foi exacerbado e muitos médicos jovens se tornaram defensores vocais de um modelo de trabalho mais humano.
Essa postura está alinhada com uma tendência cultural mais ampla, em que as novas gerações valorizam o equilíbrio entre vida profissional e pessoal como um pilar para a saúde e a felicidade a longo prazo. É um passo importante para mudar a cultura da profissão médica, historicamente associada à resiliência extrema, para uma abordagem mais sustentável e compassiva, tanto para os profissionais quanto para os pacientes.
Se você é médico, saiba que cuidar de si é essencial para cuidar do outro. Por isso, estabelecer uma rotina saudável incluindo atividades físicas, noites bem dormidas, técnicas de mindfulness e alimentação equilibrada vão ajudar a manter a saúde em dia. Assim como colocamos a máscara de oxigênio no avião antes de ajudar os outros, precisamos priorizar nossa saúde para continuarmos salvando vidas com excelência.
*Texto escrito pela psicóloga Juliana Orrico (CRP-SP 06/133394), mestre em Família na Sociedade Contemporânea